O ministro da Nova Aliança (8.1-13)
Extraído da Série Cultura Bíblica – Hebreus: introdução e
comentário (Editora Mundo Cristão) - Donald Guthrie
1. Visto que o escritor já discursou com bastantes
detalhes a respeito de Cristo como Sumo Sacerdote, pode-se querer saber o que
ainda falta para sua exposição. Por enquanto, porém, não explicou como nosso
Sumo Sacerdote leva a efeito Seus deveres. Este é realmente o tema dos próximos
dois capítulos e meio (até 10.18), mas outra questão importante, a Nova
Aliança, é introduzida no decurso da discussão. No presente capítulo, o
ministério de Jesus e a necessidade de uma nova aliança estão ligados entre si.
A frase inicial revela o essencial da discussão anterior (Ora, o essencial das coisas que temos dito, é que...). A palavra poderia significar “resumo”, mas o contexto
revela que “essencial” é melhor, porque o enfoque recai sobre aquilo que o Sumo
Sacerdote tem para oferecer e onde realiza seu ministério.
Em primeiro lugar, no entanto, é dada uma declaração
breve acerca das características peculiares do nosso Sumo Sacerdote, (i) Ele se assentou à destra do trono da
Majestade nos céus. Esta consideração
já foi feita em 1.3 a respeito do Filho, mas agora é repetida com aplicação
direta ao tema sumo-sacerdotal. Isto demonstra quão cuidadosamente o escritor
trabalhou sua tese, constantemente dando indícios que são
joias em si mesmos, mas que reluzem com novos significados quando são vistos contra
um pano de fundo diferente. Na verdade, esta ideia de Cristo assentado ocorre
outra vez em 10.12 e 12.2. Significa uma obra feita bem e verdadeiramente. A
ideia é baseada no Salmo 110.1. À parte da presente declaração e a redação
paralela em 1.3, o único outro lugar onde o termo Majestade é usado é Judas 25, onde ocorre como um atributo de Deus, mas não como um
título. O fato de que nosso Sumo Sacerdote está sentado à destra de Deus ressalta
Sua categoria em comparação com a linhagem de Arão, cujos sacerdotes somente
podiam ficar de pé na presença de Deus, sendo que sua tarefa nunca estava
definitivamente completa.
2. A segunda característica é que (ii) é ministro do santuário e do verdadeiro
tabernáculo. Isto parece estranho à primeira vista, porque segue o ato de sentar-Se.
Chama a atenção, no entanto, à obra contínua de Cristo. A palavra traduzida
“ministro” (leitourgos) ocorreu uma vez antes nesta Epístola em 1.7,
referindo-se aos anjos numa citação de Salmo 104.4. Paulo usa a palavra para
seu próprio ministério cristão (Rm 15.16) e para o serviço de Epafrodito (Fp
2.25). Até mesmo a usa para as autoridades seculares em Romanos 13.6. No
presente contexto, no entanto, o ministério em vista diz respeito especialmente
às coisas santas, conforme demonstra o contexto. O santuário (tòn hagiòn) pode ser especialmente entendido a respeito do Santo
dos Santos, como em 9.3. A conexão entre este e a ideia da tenda (tabernáculo)
é significante, porque demonstra que a base da linguagem figurada do escritor
não é o Templo, mas, sim, o tabernáculo. O adjetivo verdadeiro visa formar um contraste com o símbolo terrestre. O lugar do ministério de
Cristo é real e espiritual, comparado com o ministério da linhagem de Arão num
tabernáculo meramente temporário. Mais uma vez, é ressaltado um contraste entre
o aparente e o real, sendo que aquele é erigido pelo homem, ao passo que o último é erigido pelo Senhor.
3. A função principal dos sumos sacerdotes terrestres agora
é transferida para nosso Sumo Sacerdote. O escritor deseja demonstrar que
Cristo cumpre as funções usuais do cargo, mas de uma maneira muito melhor do
que a linhagem de Arão as cumpriu. A declaração: Pois todo sumo sacerdote é constituído, é um eco exato de 5.1, mas ao passo que a nomeação
ali é para um propósito de representação, aqui é mais
especificamente para oferecer dons e sacrifícios, i.é, no cumprimento da
respectiva função.
Estes sacrifícios são uma alusão direta às ofertas
levíticas e possivelmente tenham principalmente em vista o Dia da Expiação.
Haverá uma exposição mais completa deste último no capítulo seguinte. Aqui, o
propósito imediato é comentar sobre o sacrifício espiritual que nosso Sumo
Sacerdote ofereceu. A esta altura, a oferta não é definida, mas o escritor já
demonstrou em 7.27 que o sacrifício era o próprio Cristo, e expande esta idéia
posteriormente. Fala da necessidade de nosso Sumo Sacerdote fazer uma oferta.
Esta é a única ocorrência no Novo Testamento onde a palavra aqui traduzida necessário (anankaios) é usada a respeito de Cristo. É usada para a obra
necessária de qualquer sumo sacerdote, mas tem um significado mais profundo
quando é aplicada a Cristo, porque havia uma necessidade divina para Ele Se
oferecer como sacrifício. Deve ser notado, além disto, que o princípio da
oferta sacerdotal é expresso numa forma impessoal — o que (ti) - que se toma pessoal somente quando é aplicada à oferta do próprio Cristo.
4. Ocorre ao escritor que talvez surja alguma confusão na
mente dos seus leitores a respeito da co-existência de duas ordens de
sacerdócio. Passa, portanto, a demonstrar que o sacerdócio de Jesus não foi
estabelecido na terra. A consideração principal que está fazendo é que é
impossível para Jesus cumprir as condições, quer na questão da genealogia, quer
na natureza exata dos dons, que estão estipuladas na Lei Mosaica. Assim passa à
sua tese de que o sacerdócio superior é aquele que opera no céu, não na terra.
Esta linha de argumento faz uma grande contribuição na direção de explicar
porque Jesus nunca cumpriu nenhuma função sacerdotal durante o Seu ministério.
Mas deve ser notado que embora Sua obra sumo sacerdotal esteja no céu, Seu
sacrifício de Si mesmo ocorreu na terra. O ministério terrestre deve ser
considerado a preparativa para a obra celestial. O versículo seguinte explica a
base da conexão entre o culto levítico e a obra de Cristo.
5. A tese que subjaz esta Epístola está baseada na
existência dalguma correspondência entre o culto ritual em Levítico e a obra
espiritual de Cristo, mas o movimento sempre é do menor para o maior. As duas
palavras empregadas aqui para expressar a idéia — figura (hypodeigma) e sombra (skia) - igualmente subentendem uma realidade mais profunda por
detrás daquilo que é visto. Uma cópia de uma grande obra-prima de arte não é o
objeto legítimo, mas dá alguma ide'ia de como é o original. A semelhança é
incompleta e não é até que seja visto o original que a glória inteira é
reconhecida. De modo semelhante, uma sombra não pode existir na realidade a não
ser que haja um objeto para lançá-la. Há alguma correspondência, mas a sombra é
inevitavelmente um quadro distorcido e quase sem detalhes do verdadeiro. O
propósito do escritor não é reduzir a glória da sombra, mas ressaltar a glória
da sua substância. O que está especialmente em mente é “o santuário celeste” (epouraniõn). Somente a palavra “celestes” aparece no grego, no
entanto, e é melhor, por isso, tratá-la de modo geral como sendo coisas celestiais (ARA), sendo que a palavra “tabernáculo” é subentendida a partir do v. 2, e
pelo uso da palavra skènè (“tenda, tabernáculo”) tanto ali quanto aqui. Fica especialmente
evidente a partir da declaração acerca de Moisés que é o pano de fundo bíblico, e não o pano de fundo do
judaísmo, com seu Templo central, que está em mente. A mente do autor remonta a
Êxodo 25.40, onde é citada a instrução de Deus a Moisés. No judaísmo
alexandrino a mesma passagem de Êxodo era exposta de acordo com princípios
platônicos, em que o tabernáculo que foi construído era considerado apenas uma
cópia imperfeita daquele que existia no céu, que o próprio Moisés viu. O
tabernáculo na terra era apenas uma sombra da realidade. Mas porque o escritor desta
Epístola cita a passagem a esta etapa do argumento? Talvez tenha suposto que seus
leitores não tivessem familiaridade com o fato de que Deus dera instruções
exatas acerca dos pormenores do tabernáculo, mas isto parece improvável. É mais
provável que quisesse lembrar os seus leitores de que até mesmo a sombra foi
minuciosamente ordenada por Deus, a fim de que pudesse demonstrar a maior
excelência do santuário celeste. Além disto, se Deus ordenou os pormenores do modelo (typosj, seu significado simbólico é assegurado. Todos os pormenores meticulosos no relato do
Êxodo teriam pouco propósito se algum antítipo melhor não estivesse sendo
prenunciado por eles. A palavra traduzida instruído (kechrèmatistaij) neste versículo não é geralmente usada no Novo
Testamento, mas, sim, refere-se a um oráculo divino, uma palavra autorizada que
precisa ser obedecida. O sacerdócio arônico e as disposições para eles não vieram
a existir por acidente,«ias por desígnio.
6. Declara-se aqui que o ministério de Cristo é tanto mais excelente (diaphotõteras), termo este que já ocorreu em 1.4. Pode ser considera da
um tipo de palavra-chave para expressar a superioridade de Cristo nesta Epístola,
especialmente porque nas suas ocorrências é ligada com a palavra superior. Neste contexto há um paralelo entre o novo ministério e o antigo, e entre a
nova aliança e a antiga. O escritor pretende expor a superioridade da nova aliança, mas por enquanto está ocupado em demonstrar que o
ministério deve ser proporcional à aliança de conformidade com a qual é
estabelecido. O ministro é um mediador da aliança. Seu ministério é visto no
contexto da aliança, o que explica porque o escritor mudou repentinamente para
o tema da nova aliança. A ideia de mediar uma aliança também será exposta mais
plenamente no capítulo seguinte (9.15ss.). Posto que uma aliança envolve duas
partes contratantes, o mediador é intermediário cuja tarefa é manter as partes
em comunhão uma com a outra. Num caso em que Deus é uma das partes e o homem é
a outra, a ideia da aliança é inevitavelmente unilateral. A apostasia é sempre
do lado do homem, e, portanto, a tarefa do mediador é principalmente agir em
prol do homem diante de Deus, embora também deva agir em prol de Deus diante
dos homens.
A base do ponto de vista de que a nova aliança é melhor
do que a antiga é que é instituída com base em
superiores promessas. Mas em que sentido
esta expressão deve ser entendida? Subentende que ambas eram baseadas em
promessas, as que havia uma diferença
qualitativa entre as duas na natureza das promessas. Este ponto de vista, no
entanto, é difícil, se todas as promessas de Deus são igualmente invioláveis.
É preferível, portanto, entender que “superior” refere-se ao propósito
espiritual mais sublime inerente na nova aliança, e.g., a ideia da lei escrita
sobre o coração (v. 10). As promessas que podem fazer assim devem ser melhores
do que promessas que somente podem levar à codificação da lei antiga (i.é, a
lei de Moisés).
7. É o fracasso da primeira aliança que fornece a
necessidade da segunda. Quando o escritor dá a entender que a primeira aliança não estava sem
efeito, não está sugerindo que a
lei estava defeituosa, mas somente que a experiência do homem sob a lei era
defeituosa. Se, na realidade, a lei tivesse sido a resposta à necessidade do
homem, não teria havido necessidade alguma de uma nova aliança. Esta declaração
é o sinal para o escritor citar uma passagem extensiva de Jeremias a fim de
explicar sua abordagem à nova aliança.
8. A função da lei na procura de falhas é claramente
ressaltada nesta citação de Jeremias 31.31-34, que é introduzida pela palavra
característica diz (legei). Isto, como já foi notado, indiretamente faz com que as
palavras da Escritura sejam as palavras faladas por Deus. Esse escritor não
está interessado em declarar o nome do profeta, porque para ele o fator crucial
é a autoridade divina por detrás da ideia que está transmitindo. A tríplice
repetição de diz o Senhor nesta citação reafirma este fato. O contexto da passagem
demonstra o povo de Deus na etapa da restauração após as provações do
cativeiro. A nova situação exige uma nova abordagem no relacionamento entre
Deus e Seu povo — em resumo, uma nova
aliança. Em primeiro lugar
na citação há uma declaração de intenção. Vêm dias... e firmarei... tem um tom de autoridade que não deixa lugar para
dúvidas. Semelhante ação é tão certa quanto a palavra de Deus, embora séculos
haveriam de passar antes do seu cumprimento. Nosso escritor não tem dúvida
alguma de que a declaração confiante desta profecia do Antigo Testamento
aplica-se à era messiânica e diz respeito diretamente ao ministério de Jesus. É
bem possível que tivesse em mente a referência à nova aliança na instituição da
Ceia do Senhor (cf. Mt 26.28).
Outro aspecto da aliança é sua aplicação tanto a Israel quanto a Judá. Historicamente, isto envolvia o saneamento da brecha que
trouxera tamanha desgraça na história antiga do povo judaico. Mas até mesmo nesta
passagem não há indício de uma nova aliança que pudesse estendesse a todas as
pessoas, tanto aos gentios como aos judeus, conforme o que aconteceu como
resultado do evangelho. Realmente, vale notar que este aspecto universal do
evangelho não acha lugar nesta Epístola, mas uma explicação suficiente disto
seria sua destinação restrita a uma audiência judaica. A palavra traduzida nova (kainè) aqui, indica alguma coisa que é nova em comparação com
aquilo que a antecedeu, ao passo que o adjetivo alternativo (neos), aplicado à mesma aliança em 12.24, indica seu frescor, em comparação com
alguma coisa velha e esgotada. Os dois aspectos estão cheios de significado.
9. O contraste entre a nova aliança e a antiga é visto
numa referência específica às circunstâncias em que a antiga aliança foi
celebrada. O pensamento israelita constantemente remontava à libertação do
Egito, porque era a partir daquele ponto na história que se podia dizer que datava
a existência independente de Israel como nação. É notável aqui que o próprio
Deus fez a aliança. Não consultou os homens. Além disto, a expressão os tomei pela mão ressalta, mais uma vez, a iniciativa divina. Embora o
grego fale de “minha mão” e ressalte assim o antropomorfismo, não deixa de ser
vividamente expressivo. É uma maneira poética de deixar claro que o povo estava
incapacitado até que Deus, por assim dizer, colocou Sua mão na deles para os conduzir atê fora da terra do Egito,
o lugar do seu cativeiro.
Uma aliança normalmente envolve a plena cooperação das
duas partes. Se uma parte contratante falhar, a aliança toma-se nula. Foi
virtualmente isto que aconteceu com a antiga aliança. Os israelitas não continuaram na... aliança, o que significa que não cumpriram suas condições. Os
pronomes “eles” e “eu” são enfáticos nos dois casos, enfatizando, mais uma vez,
a prerrogativa divina. Este fato é visto igualmente na descrição da aliança
como sendo minha aliança. Quando Deus declara: eu não atentei para eles, não se deve pensar que se trata de um ato arbitrário de
falta de solicitude, mas como a consequência inevitável de Seu povo virar as
costas à aliança da graça que Ele fizera para o benefício e a bênção deles.
10. Agora vem uma exposição da prometida nova aliança. Tem
várias características dignas de nota. Diz respeito à casa de Israel, expressão esta que idealmente inclui a totalidade do povo de Deus, embora, no
contexto de Jeremias, principalmente o povo judaico. Entrará em vigor depois daqueles dias, que forma uma ligação com “estes últimos dias” mencionados em 1.2 e
refere-se à era cristã. O texto hebraico deste versículo tem o singular “lei,”
que, por alguma razão, foi traduzida pela Septuaginta como leis, no plural, como aqui. Isto é bastante significativo porque em nenhuma outra
ocasião a Septuaginta traduz o singular hebraico desta maneira. É possível que
o tradutor quisesse enfatizar as diferentes partes da lei de Deus para
distinguir estas partes da lei de Moisés como uma unidade completa. A passagem contém
um contraste subentendido entre a lei escrita nas tábuas de pedra e as leis
colocadas nas suas mentes. Não pode haver dúvida de que estas últimas são
superiores àquela, porque aquilo que está na mente não pode deixar de afetar a
atividade. A declaração dupla: nas
suas mentes e sobre os seus corações, um exemplo de paralelismo poético hebraico, enfatiza o
caráter interior da nova aliança. Dos dois termos, o mais abrangente no uso
hebraico é coração, que envolvia não somente a vontade, como também as emoções.
Os dois termos nesta citação são melhor considerados num sentido corporativo,
como se o escritor tivesse em mira o caráter coletivo do outro parceiro na
aliança feita por Deus. Há um sentido em que as novas leis são impressas na
mente e no coração do povo como um todo.
Embora a antiga aliança tivesse demonstrado que Deus era
o Deus de Israel e que consideraria Israel como Seu povo, há um sentido mais
pro fundo em que isto poderia ser realizado num sentido plenamente espiritual somente
na nova aliança. Ressalte-se de modo significante os pronomes seu (autois = “deles”) e meu (moi). O grego oferece uma expressão sucinta: “Eu serei para
eles como Deus, e eles serão para mim como povo.” O relacionamento deve ser
íntimo e mútuo.
11. Outro aspecto da nova aliança é que o conhecimento de
Deus agora pode vir diretamente, sem a necessidade de intermediários. A
comunhão com Deus será tal que todos entre Seu povo O conhecerão. Este fato
exclui imediatamente a idéia de uma classe privilegiada de iniciados especiais
que seriam os únicos que pudessem ensinar os outros, conforme existiam, por
exemplo, nas religiões de mistério, e que certamente era alimentada até certo
ponto pelo sistema dos escribas no judaísmo. Além disto, na comunidade da nova
aliança não haveria distinções de classe devidas à idade ou à categoria, porque
o conhecimento de Deus estaria disponível para a gama inteira, desde o menor deles até ao maior. A verdadeira comunidade cristã tem a intenção de ser um
grupo em que todos estão em pé de igualdade através de uma experiência comum e
pessoal do Senhor, porque todos me conhecerão.
12. A citação termina com uma explicação da base
espiritual da nova aliança. Deus revela Seu próprio caráter: usarei de misericórdia. Não há sugestão alguma de que este seja um novo
desenvolvimento no caráter divino, porque a antiga aliança era baseada na
misericórdia. O homem nunca poderia chegar a Deus se não fosse a misericórdia
dEle. Mas na nova aliança a misericórdia de Deus destaca-se mais claramente.
Fornece um fundamento seguro para Seu povo aproximar-se dEle. A segunda revelação:
e dos seus pecados jamais me lembrarei, é reconfortante porque significa que o perdão é completo.
Já não haverá possibilidade de pecados, uma vez perdoados, serem levantados
contra o povo de Deus. Todas as garantias neste sentido, antes da era cristã,
eram baseados na eficácia daquele sacrifício perfeito ainda a ser oferecido, do
qual as ofertas levíticas eram apenas uma sombra. Semelhante certeza direta do
perdão divino deve ter sido como o som de música para um povo exilado cujas
ofertas sacrificiais já não eram possíveis. As linhas paralelas que se referem
às iniqüidades (adikiai) e aos pecados (hamartiai) são outro caso de paralelismo poético semítico. A segunda
palavra é mais geral e abrangente que a primeira, mas as duas se complementam
mutuamente ao enfatizarem a idéia de perdão completo.
13. Tendo completado sua citação de Jeremias, o escritor
agora dá seu comentário sobre ela, e, ao assim fazer, vai além do propósito original
da passagem. Entende que a exposição da nova aliança subentende que a antiga é obsoleta. Olhando a passagem a partir do limiar da era cristã, vê mais nas palavras
do que era possível para Jeremias. A palavra traduzida antiquado (pepalaiõken) está no tempo perfeito, o que sugere que a primeira
aliança já se tomara obsoleta, e que o resultado disto ainda está evidente no
presente. O mesmo verbo é usado na segunda frase como um particípio do
presente, se toma antiquado, porque o escritor quer ressaltar que embora
teoricamente a antiga já se tornou obsoleta, na práticaé um processo paulatino.
A combinação entre este pensamento com o de tomar-se envelhecido ressalta a inevitabilidade do processo. Assim como as pessoas envelhecem e
morrem, ilustrando, assim, o seu caráter efêmero, igualmente a antiga aliança é
efêmera. Uma palavra interessante é usada para descrever o fim da antiga aliança,
i.é, prestes a desaparecer
(engys apanismou). A forma verbal da
mesma palavra é usada para a efemeridade da vida humana em Tiago 4.14, como um
vapor que aparece repentinamente e desaparece com igual rapidez. É fundamental
na teologia crista que a antiga aliança já cumpriu sua função e que agora cedeu
lugar à nova. Historicamente a continuação do ritual do Templo foi tomada
impossível pela destruição daquele Templo pelo general romano, Tito, mas de
qualquer maneira, os dias do ritual já estavam contados.
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